Pelos caminhos de Camilo
near Friume, Vila Real (Portugal)
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Trail photos
Itinerary description
Em Bragadas podemos ver a casa do Barroso com a sua famosa porta, e daí descer até à levada que segue o vale do Beça onde Camilo conta que andava às trutas quando a noite o apanhou e ele foi 'rebentar à porta do tio Barroso'.
Santo Aleixo de Além Tâmega era a terra da Josefa da Lage, e dos seus amores com o morgado António Queirós de Menezes. Ainda estão hoje visíveis a cangosta do Estevão por onde ele foge de casa carregando a filha recém nascida e as poldras de Santo Aleixo onde ela morre deixando a Maria Moisés a flutuar rio abaixo no seu berço de vime.
A partir daqui são os caminhos de Camilo, ele próprio. Não bem aqueles que ele trilharia entre Friúme e a Granja Velha pois que a albufeira vai alterando a paisagem, mas ainda assim imbuídos do seu espírito. Em Friúme vê-se a casa em que o adolescente de 16 anos vive com a sua esposa de 14. De Friúme sobe-se por caminhos antigos para Ribeira de Pena até à igreja de São Salvador, onde Camilo casou e em cuja porta afixou as poesias que haviam de forçar a sua fuga para o Porto e levar ao abandono da família.
Recomendo a leitura dos roteiros camilianos de Ribeira de Pena
https://cm-rpena.pt/documentos/Roteiro_Camiliano.pdf
https://cm-rpena.pt/documentos/Roteiro%20Maria%20Mois%C3%A9s.pdf
para uma melhor compreensão do percurso e do território (de onde são retiradas as explicações das fotografias). E já agora a leitura da novela Maria Moisés
https://bibliotecadigital.flavioresende.pt/download/124/Maria%20Moises%20-%20Camilo%20Castelo%20Branco.pdf
O percurso é mais fácil no sentido inverso.
A travessia do Tâmega em breve tornar-se-á impossível na velha ponte e terá que ser feita pela ponte nova. As poldras e toda a paisagem será fortemente alterada. Este inverno é a última oportunidade para ver esta paisagem como Camilo a conheceu.
Waypoints
Casa do Barroso - A Porta da história
A Casa do Barroso, em Bragadas, é uma curiosidade da arquitectura rural do século XVIII. Inserida numa povoação situada a meio da encosta norte do Tâmega, fronteira do Barroso, marca uma nota dissonante pela qualidade da sua fábrica. De facto, a Casa do Barroso ostenta, num canto escondido , um magnífico portal em granito, brasonado, e virada a poente e a sul uma fachada com cantaria fina, envolvendo uma pedra de armas de grande dimensão, que encima uma escadaria incompleta. Que a Casa do Barroso não viu o seu projecto concluído é óbvio para quem ali se desloca. Qual o motivo para a interrupção das obras, não é fácil hoje descobrir. O que é certo é que Camilo, que por ali deverá ter passado quando viveu em Friúme, escreveu um belíssimo conto a propósito da casa, que intitulou “História de uma Porta” e que pode ser lido no livro “Noites de Lamego”. Em Bragadas, a história que Camilo escreveu “virou” verdade. O poder da construção de mitos inerente à criação dos bons escritores...Mas será bom saber que o brasão esculpido no portal e no cimo da escadaria da Casa doBarroso pertenceu a Domingos Francisco Pena de Carvalho, natural deRibeira de Pena, que a ele teve direito por carta régia passada a 25 deSetembro de 1756. Fui a uma aldeia, pendurada de uns rochedos de Barroso. Bragadas era o seu nome. Chamavam-me ali as trutas do rio Beça, asmaiores trutas dos córregos riquíssimos de Portugal. Distanciei-me duas léguas de casa, e fui surpreendido pela noite, debruçado por sobre uma fraga, com o anzol numa levada, onde vi uma truta velha, de cabelos brancos, como lá dizem. Desta macróbia se dizia que tinha impunemente engolido anzóis! O peixe era um Mitrídates da sua classe! Assustado da noite e transviado do caminho, fui dar àquela aldeia, e perguntei a um pastor se lá havia padre. Casa de padre é sempre albergaria certa de forasteiros, mesa farta e cama limpa. Não havia padre em Bragadas. -Quemme dá agasalho nesta povoação? – perguntei ao pegureiro informador. - Quem quer lhe dá agasalho. - Mas onde hei-de eu ir bater? - Vá vocemecê por esse quinchoso abaixo; lá ao todo fundo carregue à sua esquerda, e salte um portelo que não tem que errar. Vocemecê vai rebentar mesmo à porta do tio Barroso...
Capela da Granja Velha
A Capela daGranja Velha é um belo exemplar do barroco rural. Foi mandada edificar por um natural daquela povoação, emigrado no Brasil, de nome Lourenço Valadares Vieira, presbítero que exerceu no Brasil importantes cargos religiosos como o de Arcediago da Sé do Rio de Janeiro e Bispo do Pará. Mandou edificar este templo na povoação da sua naturalidade para “homenagear os antepassados e para que a população tivesse um local condigno para assistir à missa”. Construída na primeirametade do século XVIII, esta Capela garantia uma dasmelhores tenças religiosas, sendo portanto cobiçado o seu lugar. Talvez isso justifique o facto de, na Granja Velha, existir em 1841 um padre de grande ilustração, com fama em toda a província, o padre Manuel Rodrigues, ou Manuel da Lixa, por ser natural da Lixa do Alvão. Foi no lugar da Granja Velha que Camilo teve aulas com o padre-mestre Manuel Rodrigues. A Capela da Granja Velha e o seu adro terão sido testemunhas de muitos dos momentos que Camilo passou em Ribeira de Pena.
Poldras de Santo Aleixo
Até ao início do século XX as pontes mais próximas de Ribeira de Pena localizavam-se em Chaves e Cavez, a várias léguas de distância. Assim, proliferavam na região os conjuntos de poldras que permitiam a travessia do rio nos meses de estio. Destes conjuntos, as poldras de Santo Aleixo são as únicas que se preservam nesta zona do rio Tâmega, resistindo mesmo aos impactos negativos resultantes da construção de uma ponte de betão no local. Foi neste conjunto que Camilo Castelo Branco se inspirou para o trágico episódio que vitimou Josefa da Lage em Maria Moisés. “Ao avistar as poldras que alvejavam puídas e resvaladiças ao lume d’água teve vertigens, e disse entre si: «Eu vou morrer». Pôs o berço à cabeça, esfregou os olhos turvos de pavor, e esperou que as pancadas do coração sossegassem.”
Vista da cangosta do Estêvão e poldras de Santo Aleixo
Até ao início do século XX as pontes mais próximas de Ribeira de Pena localizavam-se em Chaves e Cavez, a várias léguas de distância. Assim, proliferavam na região os conjuntos de poldras que permitiam a travessia do rio nos meses de estio. Destes conjuntos, as poldras de Santo Aleixo são as únicas que se preservam nesta zona do rio Tâmega, resistindo mesmo aos impactos negativos resultantes da construção de uma ponte de betão no local. Foi neste conjunto que Camilo Castelo Branco se inspirou para o trágico episódio que vitimou Josefa da Lage em Maria Moisés. Os pilares que se vêm na foto são da ponte. As poldras são as pedras à frente destes. “Ao avistar as poldras que alvejavam puídas e resvaladiças ao lume d’água teve vertigens, e disse entre si: «Eu vou morrer». Pôs o berço à cabeça, esfregou os olhos turvos de pavor, e esperou que as pancadas do coração sossegassem.”
Casa de Camilo
Camilo Castelo Branco vai viver, entre um a dois anos da sua vida, depois de abandonar a Samardã. Alojado em casa de sua prima, Maria do Loreto, casada com o lavrador da Casa do Moreira, daqui podia seguir as aulas do padre mestre na Granja Velha. Perto da Casa doMoreira, emFriúme, ficava a casa deSebastião Martins dosSantos, que tinha uma filha fresca e provavelmente bonita, chamada Joaquina. Acrescido ao facto de casamento significar liberdade para Camilo (que assim poderia assumir a sua legítima por morte do pai) e cobiça para o sogro, tenha levado ao casamento dos dois jovens, Camilo então com16 anos, ela com14. Em Friúme, e pelo menos durante um mês como é comprovado documentalmente, Camilo foi amanuense do tabelião José de Mesquita Chaves. Segundo ele próprio vem a declarar mais tarde, ali “aprendeu a jogar às damas e ao gamão”.
Igreja do Salvador
A Igreja Matriz do Divino Salvador, é um edifício construído na segunda metade do século XVIII e que se ficou a dever à benemerência de um emigrante ribeirapenense no Brasil, Manuel José de Carvalho. A lenda conta que Manuel José de Carvalho, muito novo, terá ido para o Brasil, onde veio a fazer fortuna.Quando abandonou a terra natal, fez a promessa de, em caso de sucesso,mandar edificar uma igreja “como não houvesse outra em dez léguas ao redor”. De como angariou fortuna, não ficou memória. O certo é que, em1759, envia para Ribeira de Pena uma carta em que manifesta o desejo de mandar edificar uma igreja, garantindo o pagamento de todas as despesas, à excepção do carreto das pedras. A Igreja vem a ser edificada, tendo-se deitado abaixo a antiga Igreja do Salvador para aproveitamento da pedra. A primeira sagração vem a ser feita em 1793, já depois da morte de Manuel José de Carvalho, que nunca chegou a ver a sua obra. A fachada manifesta ainda uma traça barroca, com alguns elementos rococó. Apresenta uma orientação invulgar a nascente e possui, por sobre o portal de entrada, um medalhão evocativo do fundador, ladeado de dois querubins comtoucado de penas e umenorme nicho com uma imagem do Divino Salvador. Foi nesta Igreja que casou, em18 deAgosto de 1841, Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco, na altura com 16 anos de idade, com Joaquina Pereira de França, uma jovem de 14 anos, natural de Gondomar e residindo na povoação de Friúme com seus pais. A Igreja está ainda ligada ao episódio com que Camilo justifica a sua saída de Ribeira de Pena.
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