De regresso à Ribeira da Beselga e Cascata da Azulada
near Ponte, Santarém (Portugal)
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Trail photos
Itinerary description
Meus olhos cansados da, por ser sempre igual, monotonia do circuito diário de manutenção e aguados por carreiros infindos de beleza e trinados, me levaram a propor que regressássemos à Beselga, que a chuva da semana passada, decerto, terá transformado a cascata que, pela secura estival longa, se nos mostrara seca as últimas vezes que ali estivéramos.
Quando passamos pela simplesinha e prática ponte pedonal que atravessa a ribeira e a transparência da água corrente, que agita e ondula uma seara verde de limos e plantas aquáticas de flores albas resistindo à corrente, me parou, o meu rosto ter-se-á iluminado e começou meu sonho de anseio feito. Antecipo a beleza de que vou desfrutar. A floração exuberante de um pessegueiro canta hinos cor de rosa de boas-vindas à primavera.
Entramos num estreito carreirito que, começando juntinho ao lavadouro que há muito não conhece peça de roupa, nos levará, ribeirinha fora, numa curta mas agradável sensação de leveza que a surdina suave da corrente de água nos proporciona. Já no estradão que liga a Beselga de Cima a Fungalvaz, olhando as centenárias oliveiras de troncos carcomidos e mirrados pela idade e as agruras do tempo, vamos pensando em como a natureza se replica em nós com o passar do tempo. Desviamos um pouco à esquerda para voltar a passar sobre as asas de um avião que servem de ponte para a outra margem da ribeira. Nunca aqui vim que não fizesse este pequeno desvio e não sei porquê. O insólito de encontrar duas asas de avião a servir de ponte na ribeira e as interrogações que suscita à minha curiosidade não são motivo suficiente. Volto ao estradão imaginando estórias rocambolescas e vou caminhando absorto, sonhando e… tropeço!... e caio… caio em mim de espanto!... que é isto?!... uma vedação tolhe-nos o acesso à Cascata da Azulada e aos carreiros ribeirinhos?... Quem terá posto aqui isto?... incrédulo, leio o letreiro pendurado na rede: “PROPRIEDADE PRIVADA / MANTENHA LIMPO”. Reparo então na porta e no ferrolho que a mantém cerrada. Não há aloquete e facilmente se destranca. Franqueada a entrada, sem réstia de culpa, admiramos então a singela cascata. Pouco exuberante mas de rara beleza deixa escorrer a água por múltiplos requebros e ressaltos salpicados de verdura. Enchem-se os olhos e a alma e esquecemos o inesperado obstáculo.
Abandonamos a cascata da Azulada seguindo pela estreita senda que nos leva a um velho moinho que ali jaz abandonado. Seguimos. Pouco mais de uma centena de metros e eis-nos num dos mais belos recantos deste trilho. A ribeira socalca sobre e por entre rochas; a água corre límpida passeando-se devagar ou asinha nos mais largos ou mais estreitos leitos; o musgo pinta as pedras de verde forte; os salgueiros debruçam os ramos sobre a ribeira e as pontes artesanais convidam à aventura de as atravessar. Não nos fazemos rogados. Passamos para lá por uma e por outra para cá. Bebemos toda esta beleza com sofreguidão mas o objetivo a que nos propusemos obriga a que partamos. Seguindo os meandros da ribeira, ouvindo o cantar da água e a melodia dos pássaros e saboreando mil odores e luminosos cambiantes, calcorreamos este carreiro que entra agora num desfiladeiro cársico. Uma pontezita, feita com troncos e tábuas velhas, leva-nos no contorno das rochas sobre a ribeira.
Vamos apontando a câmara do telemóvel ora à água mansa que se espraia sobre limos e musgos ora aos ressaltos e requebros da ribeira que espumam brancura sobre as pedras.
Atravessamos o asfalto passando sobre a ponte da estrada de Assentiz a Fungalvaz e voltamos à ribeira. Uma arruinada represa, que há muito não represa a água que dava a força necessária para girar a mó de um moinho, de que não restam vestígios, não põe obstáculo à corrente da ribeira. Seguimos entre o cantar da água e o dos pardais que pululam num campo de cultivo à espera de arado. À frente passamos juntinho a um pequeno bosque de sobreiros, pinheiros e carvalhos. Um trilho lamacento obriga-nos a cirandar para colocar as botas e não as sujar em demasia. E agora?... temos que passar para a outra margem!... olhamos as pedras do leito da ribeira avaliando as hipóteses de não nos esbardalharmos se, equilibrando-nos sobre elas, tentarmos atravessar. Com mil cuidados passamos de pedra em pedra sem molhar as botas.
O vale aqui alarga mas nós seguimos junto à vertente cársica apreciando as formas talhadas na escarpa. O carreiro vermelho é agora ladeado de murta, aroeira, cistos e uma infinidade de outras plantas que vão colorindo e odorando o caminho. O sol a pino aquece e as abelhas zumbem na eterna faina recolectora do pólen.
Uma pequena lapa à beira do carreiro abre-nos o apetite para o que vamos ver a seguir. Uma dissimulada abertura no mato mostra um carreiro em declive acentuado.
- Vamos, é por aqui.
- Por aí?!!!
Tem que ser. O que nos espera compensa receios de possíveis escorregadelas. Agarrados à generosidade dos zambujeiros e carrascos que nos oferecem os ramos para nos apoiarmos, vamos subindo a arriba escarpada. E cá estamos. Uma lapa em forma de túnel mostra as variantes de amarelo terroso que a luz, que entra por ambos os extremos, aviva e torna a imagem numa experiência fantástica. Chamam-lhe “Fórnea". O nome vem de antigamente, provavelmente de quando uma das extremidades ainda seria fechada. Apreciamos os pormenores e as vistas que, de um e outro lado, se nos apresenta da outra encosta do desfiladeiro.
Agora descer por onde subimos é nova e mais difícil aventura.
Estamos cá em baixo sem registo de ocorrência desagradável.
Continuamos junto à ribeira mas deixámos de escutar o cantar da água. Espreitamos. E cá está, o leito da ribeira é agora enxuto de água mas abundante de musgo que cobre as pedras. Decerto que o leito é aqui subterrâneo, já que a nascente ainda fica longe. Passamos a seco para a outra margem.
O carreiro segue agora sob um delícia em forma de galeria ripícola ensombreando o sol forte e ofertando vislumbres de magia. Recomeçamos a ouvir a água na ribeira.
Uma recém-construída e inacabada ponte em madeira permite que mudemos mais uma vez de margem.
Um pouquinho andado e o leito do rio de novo seco. Compensa a beleza que mostram as pedras musgadas.
Uma placa amarela, presa nos arbustos, diz que caminhamos num trilho que alguém batizou de “Superfresco". Parece que não é marca de refrigerante mas de uma equipa de trail daqui desta zona. Se foi este “team" que abriu e mantém o trilho limpo, bem haja.
Por um estradão empossado de água barrenta, chegamos à EN349. Atravessamos e um pouco mais adiante somos confrontados com a necessidade de atravessar de novo a ribeira. A água é baixa e limpa. Umas pedritas espalhadas no leito abriram a esperança de não ter que descalçar as botas. Com o jeitinho deste jeitoso lá se foram ajeitando as pedras à medida que íamos atravessando. E pronto, botas enxutas e lá vamos por estradões até aos moinhos da Pena.
Diz-se que este é o terceiro maior conjunto de moinhos de vento em Portugal. São 12. Sete na freguesia de Chancelaria e 5 na de Assentiz. Dominam a paisagem mas são mortos vivos. Morreram no meio da década de 60 quando o último moleiro fechou tristemente a porta, deixando para trás o que tinha sido o seu ganha-pão de décadas e era agora substituído por uns pacotinhos de papel, com uma farinha tão branca que nem farinha parecia, à venda nas mercearias por um preço que nem o trabalho dele pagaria. 25 anos depois, à custa de fundos comunitários, ressuscitavam-se os velhos moinhos mas… para fins turísticos. Dois seriam recuperados para serem moinhos e os restantes para alojamento. Hoje, apenas um mostra o mastro e as vergas em bom estado mas nus. Por dentro não sei, está fechado. Como se gasta o dinheiro para objetivos fúteis. Quem se lembra que o passado é que fundamenta o presente?... não somos apenas o produto de guerras que plejámos, terras que descobrimos ou povos que conquistámos. Somos descentes também daqueles que labutaram a terra agarrados à rabeta do arado ou ao cabo da enxada; construíram moinhos movidos a vento ou água; percorreram montes e vales, pisando carreiros, tocando o burro carregado de talegas de farinha, de milho feijão ou grão… somos tudo isso e isso espelha-se nas estruturas que conservámos e são museus vivos da cultura que nos corre nas veias…
Esquecido de mim fui percorrendo o caminho que une onze moinhos, o último está do lado de lá da estrada alcatroada. A paisagem que deste outeiro se avista é muito bonita mas hoje nem a apreciei devidamente.
Descemos uma pequena encosta e atravessamos a estrada.
Vamos estradão fora em busca de outros carreiros. Ao lado um senhor já de avançada idade encosta a escada de alumínio à oliveira que precisa de poda, ainda que tardia. Antigamente a escada seria de pau e feita pelo podador.
- Então, podando as oliveiras?...
- Deram pouco o ano passado, estou a limpá-las a ver se dão alguma coisita este ano.
- Cuidado, não caia.
- Não sou eu que subo, é o rapaz. Eu já tou velho pra isso.
- Fique com Deus.
- Bem haja e boa viagem.
E aqui vamos viajando por estas charnecas fora.
Deixámos o estradão e entramos num carreiro maravilhoso ladeado de torga branca exalando perfume. Ouve-se o zumbido da azáfama das abelhas.
É uma hora. Escolhemos um canto soalheiro, sentamo-nos e almoçamos o farnel que nos tem vindo a pesar nas mochilas.
Cá vamos de novo. Um trilho por alguém designado “Trilho do Lacrau", com vegetação abundante dos lados e por cima, é agora o nosso caminho. O desconhecimento da causa leva-nos a conjeturas pouco prováveis para justificar o nome dado ao trilho. Pouco importa, a beleza que nos rodeia some o pensamento e traz o desfrute.
Entramos noutro trilho batizado. A este chamaram “Trilho das Mós Rolantes”. Se rolassem por esta encosta decerto que não seguiriam este lindo e sinuoso trilho. Passamos por uma mó partida. Terá rolado?... não me parece mas também não vejo razão para aqui estar. Provavelmente uma falha na construção levou a que se partisse e a ser abandonada onde estava a ser construída.
Um estradão trouxe-nos de novo à Beselga de Cima. Passamos em frente da vetusta capela e uma questão se nos coloca: que sentido etimológico terá este topónimo, Beselga?... A consulta rápida à Diciopédia pelo telemóvel diz que o nome deriva do latim “basilica", tratando-se de uma igreja ou capela.
Não satisfeito irei em casa pesquisar outras fontes. Por agora, e chegados que somos, fecho o percurso. Editarei o texto se a pesquisa acrescentar algo interessante. Por aqui me fico, com gratidão na alma e um belíssimo percurso na lembrança.
Quando passamos pela simplesinha e prática ponte pedonal que atravessa a ribeira e a transparência da água corrente, que agita e ondula uma seara verde de limos e plantas aquáticas de flores albas resistindo à corrente, me parou, o meu rosto ter-se-á iluminado e começou meu sonho de anseio feito. Antecipo a beleza de que vou desfrutar. A floração exuberante de um pessegueiro canta hinos cor de rosa de boas-vindas à primavera.
Entramos num estreito carreirito que, começando juntinho ao lavadouro que há muito não conhece peça de roupa, nos levará, ribeirinha fora, numa curta mas agradável sensação de leveza que a surdina suave da corrente de água nos proporciona. Já no estradão que liga a Beselga de Cima a Fungalvaz, olhando as centenárias oliveiras de troncos carcomidos e mirrados pela idade e as agruras do tempo, vamos pensando em como a natureza se replica em nós com o passar do tempo. Desviamos um pouco à esquerda para voltar a passar sobre as asas de um avião que servem de ponte para a outra margem da ribeira. Nunca aqui vim que não fizesse este pequeno desvio e não sei porquê. O insólito de encontrar duas asas de avião a servir de ponte na ribeira e as interrogações que suscita à minha curiosidade não são motivo suficiente. Volto ao estradão imaginando estórias rocambolescas e vou caminhando absorto, sonhando e… tropeço!... e caio… caio em mim de espanto!... que é isto?!... uma vedação tolhe-nos o acesso à Cascata da Azulada e aos carreiros ribeirinhos?... Quem terá posto aqui isto?... incrédulo, leio o letreiro pendurado na rede: “PROPRIEDADE PRIVADA / MANTENHA LIMPO”. Reparo então na porta e no ferrolho que a mantém cerrada. Não há aloquete e facilmente se destranca. Franqueada a entrada, sem réstia de culpa, admiramos então a singela cascata. Pouco exuberante mas de rara beleza deixa escorrer a água por múltiplos requebros e ressaltos salpicados de verdura. Enchem-se os olhos e a alma e esquecemos o inesperado obstáculo.
Abandonamos a cascata da Azulada seguindo pela estreita senda que nos leva a um velho moinho que ali jaz abandonado. Seguimos. Pouco mais de uma centena de metros e eis-nos num dos mais belos recantos deste trilho. A ribeira socalca sobre e por entre rochas; a água corre límpida passeando-se devagar ou asinha nos mais largos ou mais estreitos leitos; o musgo pinta as pedras de verde forte; os salgueiros debruçam os ramos sobre a ribeira e as pontes artesanais convidam à aventura de as atravessar. Não nos fazemos rogados. Passamos para lá por uma e por outra para cá. Bebemos toda esta beleza com sofreguidão mas o objetivo a que nos propusemos obriga a que partamos. Seguindo os meandros da ribeira, ouvindo o cantar da água e a melodia dos pássaros e saboreando mil odores e luminosos cambiantes, calcorreamos este carreiro que entra agora num desfiladeiro cársico. Uma pontezita, feita com troncos e tábuas velhas, leva-nos no contorno das rochas sobre a ribeira.
Vamos apontando a câmara do telemóvel ora à água mansa que se espraia sobre limos e musgos ora aos ressaltos e requebros da ribeira que espumam brancura sobre as pedras.
Atravessamos o asfalto passando sobre a ponte da estrada de Assentiz a Fungalvaz e voltamos à ribeira. Uma arruinada represa, que há muito não represa a água que dava a força necessária para girar a mó de um moinho, de que não restam vestígios, não põe obstáculo à corrente da ribeira. Seguimos entre o cantar da água e o dos pardais que pululam num campo de cultivo à espera de arado. À frente passamos juntinho a um pequeno bosque de sobreiros, pinheiros e carvalhos. Um trilho lamacento obriga-nos a cirandar para colocar as botas e não as sujar em demasia. E agora?... temos que passar para a outra margem!... olhamos as pedras do leito da ribeira avaliando as hipóteses de não nos esbardalharmos se, equilibrando-nos sobre elas, tentarmos atravessar. Com mil cuidados passamos de pedra em pedra sem molhar as botas.
O vale aqui alarga mas nós seguimos junto à vertente cársica apreciando as formas talhadas na escarpa. O carreiro vermelho é agora ladeado de murta, aroeira, cistos e uma infinidade de outras plantas que vão colorindo e odorando o caminho. O sol a pino aquece e as abelhas zumbem na eterna faina recolectora do pólen.
Uma pequena lapa à beira do carreiro abre-nos o apetite para o que vamos ver a seguir. Uma dissimulada abertura no mato mostra um carreiro em declive acentuado.
- Vamos, é por aqui.
- Por aí?!!!
Tem que ser. O que nos espera compensa receios de possíveis escorregadelas. Agarrados à generosidade dos zambujeiros e carrascos que nos oferecem os ramos para nos apoiarmos, vamos subindo a arriba escarpada. E cá estamos. Uma lapa em forma de túnel mostra as variantes de amarelo terroso que a luz, que entra por ambos os extremos, aviva e torna a imagem numa experiência fantástica. Chamam-lhe “Fórnea". O nome vem de antigamente, provavelmente de quando uma das extremidades ainda seria fechada. Apreciamos os pormenores e as vistas que, de um e outro lado, se nos apresenta da outra encosta do desfiladeiro.
Agora descer por onde subimos é nova e mais difícil aventura.
Estamos cá em baixo sem registo de ocorrência desagradável.
Continuamos junto à ribeira mas deixámos de escutar o cantar da água. Espreitamos. E cá está, o leito da ribeira é agora enxuto de água mas abundante de musgo que cobre as pedras. Decerto que o leito é aqui subterrâneo, já que a nascente ainda fica longe. Passamos a seco para a outra margem.
O carreiro segue agora sob um delícia em forma de galeria ripícola ensombreando o sol forte e ofertando vislumbres de magia. Recomeçamos a ouvir a água na ribeira.
Uma recém-construída e inacabada ponte em madeira permite que mudemos mais uma vez de margem.
Um pouquinho andado e o leito do rio de novo seco. Compensa a beleza que mostram as pedras musgadas.
Uma placa amarela, presa nos arbustos, diz que caminhamos num trilho que alguém batizou de “Superfresco". Parece que não é marca de refrigerante mas de uma equipa de trail daqui desta zona. Se foi este “team" que abriu e mantém o trilho limpo, bem haja.
Por um estradão empossado de água barrenta, chegamos à EN349. Atravessamos e um pouco mais adiante somos confrontados com a necessidade de atravessar de novo a ribeira. A água é baixa e limpa. Umas pedritas espalhadas no leito abriram a esperança de não ter que descalçar as botas. Com o jeitinho deste jeitoso lá se foram ajeitando as pedras à medida que íamos atravessando. E pronto, botas enxutas e lá vamos por estradões até aos moinhos da Pena.
Diz-se que este é o terceiro maior conjunto de moinhos de vento em Portugal. São 12. Sete na freguesia de Chancelaria e 5 na de Assentiz. Dominam a paisagem mas são mortos vivos. Morreram no meio da década de 60 quando o último moleiro fechou tristemente a porta, deixando para trás o que tinha sido o seu ganha-pão de décadas e era agora substituído por uns pacotinhos de papel, com uma farinha tão branca que nem farinha parecia, à venda nas mercearias por um preço que nem o trabalho dele pagaria. 25 anos depois, à custa de fundos comunitários, ressuscitavam-se os velhos moinhos mas… para fins turísticos. Dois seriam recuperados para serem moinhos e os restantes para alojamento. Hoje, apenas um mostra o mastro e as vergas em bom estado mas nus. Por dentro não sei, está fechado. Como se gasta o dinheiro para objetivos fúteis. Quem se lembra que o passado é que fundamenta o presente?... não somos apenas o produto de guerras que plejámos, terras que descobrimos ou povos que conquistámos. Somos descentes também daqueles que labutaram a terra agarrados à rabeta do arado ou ao cabo da enxada; construíram moinhos movidos a vento ou água; percorreram montes e vales, pisando carreiros, tocando o burro carregado de talegas de farinha, de milho feijão ou grão… somos tudo isso e isso espelha-se nas estruturas que conservámos e são museus vivos da cultura que nos corre nas veias…
Esquecido de mim fui percorrendo o caminho que une onze moinhos, o último está do lado de lá da estrada alcatroada. A paisagem que deste outeiro se avista é muito bonita mas hoje nem a apreciei devidamente.
Descemos uma pequena encosta e atravessamos a estrada.
Vamos estradão fora em busca de outros carreiros. Ao lado um senhor já de avançada idade encosta a escada de alumínio à oliveira que precisa de poda, ainda que tardia. Antigamente a escada seria de pau e feita pelo podador.
- Então, podando as oliveiras?...
- Deram pouco o ano passado, estou a limpá-las a ver se dão alguma coisita este ano.
- Cuidado, não caia.
- Não sou eu que subo, é o rapaz. Eu já tou velho pra isso.
- Fique com Deus.
- Bem haja e boa viagem.
E aqui vamos viajando por estas charnecas fora.
Deixámos o estradão e entramos num carreiro maravilhoso ladeado de torga branca exalando perfume. Ouve-se o zumbido da azáfama das abelhas.
É uma hora. Escolhemos um canto soalheiro, sentamo-nos e almoçamos o farnel que nos tem vindo a pesar nas mochilas.
Cá vamos de novo. Um trilho por alguém designado “Trilho do Lacrau", com vegetação abundante dos lados e por cima, é agora o nosso caminho. O desconhecimento da causa leva-nos a conjeturas pouco prováveis para justificar o nome dado ao trilho. Pouco importa, a beleza que nos rodeia some o pensamento e traz o desfrute.
Entramos noutro trilho batizado. A este chamaram “Trilho das Mós Rolantes”. Se rolassem por esta encosta decerto que não seguiriam este lindo e sinuoso trilho. Passamos por uma mó partida. Terá rolado?... não me parece mas também não vejo razão para aqui estar. Provavelmente uma falha na construção levou a que se partisse e a ser abandonada onde estava a ser construída.
Um estradão trouxe-nos de novo à Beselga de Cima. Passamos em frente da vetusta capela e uma questão se nos coloca: que sentido etimológico terá este topónimo, Beselga?... A consulta rápida à Diciopédia pelo telemóvel diz que o nome deriva do latim “basilica", tratando-se de uma igreja ou capela.
Não satisfeito irei em casa pesquisar outras fontes. Por agora, e chegados que somos, fecho o percurso. Editarei o texto se a pesquisa acrescentar algo interessante. Por aqui me fico, com gratidão na alma e um belíssimo percurso na lembrança.
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The start of this trail is going through private property. The owner says you can walk through their land but please show respect for the property and it's beautiful nature. It's ok to go by foot. Don't pass with bikes or motorcycles. Pedestrians are kindly requested to leave the place the way they found it.